A Resolução nº 487 do Conselho Nacional de Justiça e a situação das pessoas em condição asilar no Complexo Médico Penal de Pinhais (PR)

Autores

  • Isabela Tonon Furtado UFPR

Resumo

A Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001, fruto da luta antimanicomial e da Reforma Psiquiátrica, estabelece que a internação da pessoa com sofrimento mental será utilizada apenas como recurso residual, quando todos os tratamentos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. Contudo, a medida de segurança de internação, prevista pelo Código Penal, não segue a lógica daquela lei. Assim, são muitas as pessoas com sofrimento mental em conflito com a lei que permanecem internadas em Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTPs) pelo Brasil, como ocorre no Complexo Médico Penal (CMP), localizado em Pinhais, no estado do Paraná. Ali, além das pessoas que cumprem medida de segurança, são mantidas pessoas que possuem sentença de desinternação ou medida de segurança extinta, mas que não podem ter a liberdade concretizada porque dependem da institucionalização, devido às suas condições clínicas ou à perda dos vínculos sociais. Essas pessoas permanecem no CMP em condição asilar. Com o objetivo de instituir a Política Antimanicomial no Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) expediu a Resolução nº 487, em 15 de fevereiro de 2023. Esta pesquisa busca entender como a referida resolução pode ser utilizada como instrumento a fim de evitar que mais pessoas acabem em condição asilar no CMP. A pesquisa entende que a orientação da resolução, no sentido de evitar a internação da pessoa com sofrimento mental e, em caso de necessidade de internação, que esta não rompa os vínculos sociais, tem potencial de cumprir aquela função.

Palavras-chave: medida de segurança; alta de internação; asilar.

Abstract

Law No. 10.216, enacted on April 6, 2001, resulted from the anti-asylum movement and the Psychiatric Reform, and stipulates that hospitalization of individuals with mental health issues should only be used as a last resort, when all other forms of treatment outside a hospital setting have been exhausted. However, the internment security measure provided for in the Penal Code does not align with this logic, and many people with mental health issues who are in conflict with the law remain interned in Custody and Psychiatric Treatment Hospitals (HCTPs) throughout Brazil. This is the case at the Penal Medical Complex (CMP) located in Pinhais, PR. There, in addition to people serving security measures, individuals who have been discharged or had their security measures lifted, but cannot be released due to medical conditions or loss of social ties, are also kept in institutionalized care. These people remain in asylum at the CMP. On February 15, 2023, the National Council of Justice (CNJ) issued Resolution No. 487 establishing the Anti-Asylum Policy in the Judiciary. This research aims to investigate how this resolution can serve as a tool to prevent individuals from being institutionalized in the CMP, acknowledging that the resolution's focus on avoiding hospitalization of individuals with mental health issues and, if necessary, preserving social connections, has the potential to achieve this goal.

Keywords: security measure; discharge; asylum.

Resumen

La Ley no. 10.216, de 6 de abril de 2001, fruto de la lucha antimanicomial y de la Reforma Psiquiátrica, establece que la internación de la persona con sufrimiento mental será utilizada solo como recurso residual, cuando todos los tratamientos extrahospitalarios se muestren insuficientes. Sin embargo, la medida de seguridad de internación, prevista por el Código Penal, no sigue la lógica de aquella ley. De ese modo, son muchas las personas con sufrimiento mental en conflicto con la ley que permanecen internadas en Hospitales de Custodia y Tratamiento Psiquiátrico (HCTPs) en Brasil, como sucede en el Complejo Médico Penal (CMP), ubicado en Pinhais, en el estado de Paraná. Allí, además de las personas que cumplen medida de seguridad, se mantienen personas que poseen sentencia de alta de internación o medida de seguridad extinta, pero que no pueden tener la libertad concretizada porque dependen de la institucionalización, debido a sus condiciones clínicas o a la pérdida de los vínculos sociales. Esas personas permanecen en el CMP en condición asilar. Con el objetivo de instituir la Política Antimanicomial en el Poder Judicial, el Consejo Nacional de Justicia (CNJ) expidió la Resolución no. 487, en 15 de febrero de 2023. Esta investigación busca entender cómo se puede utilizar la referida resolución como instrumento a fin de evitar que más personas terminen en condición asilar en el CMP. La investigación entiende que la orientación de la resolución, en el sentido de evitar la internación de la persona con sufrimiento mental y, en caso de necesidad de internación, que esta no rompa los vínculos sociales, tiene potencial de cumplir aquella función.

Palabras clave: medida de seguridad; alta de internación; asilar.

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Biografia do Autor

Isabela Tonon Furtado, UFPR

A Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001, fruto da luta antimanicomial e da Reforma Psiquiátrica, estabelece que a internação da pessoa com sofrimento mental será utilizada apenas como recurso residual, quando todos os tratamentos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. Contudo, a medida de segurança de internação, prevista pelo Código Penal, não segue a lógica daquela lei. Assim, são muitas as pessoas com sofrimento mental em conflito com a lei que permanecem internadas em Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTPs) pelo Brasil, como ocorre no Complexo Médico Penal (CMP), localizado em Pinhais, no estado do Paraná. Ali, além das pessoas que cumprem medida de segurança, são mantidas pessoas que possuem sentença de desinternação ou medida de segurança extinta, mas que não podem ter a liberdade concretizada porque dependem da institucionalização, devido às suas condições clínicas ou à perda dos vínculos sociais. Essas pessoas permanecem no CMP em condição asilar. Com o objetivo de instituir a Política Antimanicomial no Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) expediu a Resolução nº 487, em 15 de fevereiro de 2023. Esta pesquisa busca entender como a referida resolução pode ser utilizada como instrumento a fim de evitar que mais pessoas acabem em condição asilar no CMP. A pesquisa entende que a orientação da resolução, no sentido de evitar a internação da pessoa com sofrimento mental e, em caso de necessidade de internação, que esta não rompa os vínculos sociais, tem potencial de cumprir aquela função.

Palavras-chave: medida de segurança; alta de internação; asilar.

Abstract

Law No. 10.216, enacted on April 6, 2001, resulted from the anti-asylum movement and the Psychiatric Reform, and stipulates that hospitalization of individuals with mental health issues should only be used as a last resort, when all other forms of treatment outside a hospital setting have been exhausted. However, the internment security measure provided for in the Penal Code does not align with this logic, and many people with mental health issues who are in conflict with the law remain interned in Custody and Psychiatric Treatment Hospitals (HCTPs) throughout Brazil. This is the case at the Penal Medical Complex (CMP) located in Pinhais, PR. There, in addition to people serving security measures, individuals who have been discharged or had their security measures lifted, but cannot be released due to medical conditions or loss of social ties, are also kept in institutionalized care. These people remain in asylum at the CMP. On February 15, 2023, the National Council of Justice (CNJ) issued Resolution No. 487 establishing the Anti-Asylum Policy in the Judiciary. This research aims to investigate how this resolution can serve as a tool to prevent individuals from being institutionalized in the CMP, acknowledging that the resolution's focus on avoiding hospitalization of individuals with mental health issues and, if necessary, preserving social connections, has the potential to achieve this goal.

Keywords: security measure; discharge; asylum.

Resumen

La Ley no. 10.216, de 6 de abril de 2001, fruto de la lucha antimanicomial y de la Reforma Psiquiátrica, establece que la internación de la persona con sufrimiento mental será utilizada solo como recurso residual, cuando todos los tratamientos extrahospitalarios se muestren insuficientes. Sin embargo, la medida de seguridad de internación, prevista por el Código Penal, no sigue la lógica de aquella ley. De ese modo, son muchas las personas con sufrimiento mental en conflicto con la ley que permanecen internadas en Hospitales de Custodia y Tratamiento Psiquiátrico (HCTPs) en Brasil, como sucede en el Complejo Médico Penal (CMP), ubicado en Pinhais, en el estado de Paraná. Allí, además de las personas que cumplen medida de seguridad, se mantienen personas que poseen sentencia de alta de internación o medida de seguridad extinta, pero que no pueden tener la libertad concretizada porque dependen de la institucionalización, debido a sus condiciones clínicas o a la pérdida de los vínculos sociales. Esas personas permanecen en el CMP en condición asilar. Con el objetivo de instituir la Política Antimanicomial en el Poder Judicial, el Consejo Nacional de Justicia (CNJ) expidió la Resolución no. 487, en 15 de febrero de 2023. Esta investigación busca entender cómo se puede utilizar la referida resolución como instrumento a fin de evitar que más personas terminen en condición asilar en el CMP. La investigación entiende que la orientación de la resolución, en el sentido de evitar la internación de la persona con sufrimiento mental y, en caso de necesidad de internación, que esta no rompa los vínculos sociales, tiene potencial de cumplir aquella función.

Palabras clave: medida de seguridad; alta de internación; asilar.

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Publicado

2024-02-01

Como Citar

Tonon Furtado, I. (2024). A Resolução nº 487 do Conselho Nacional de Justiça e a situação das pessoas em condição asilar no Complexo Médico Penal de Pinhais (PR). IUS GENTIUM, 14(2), 92–112. Recuperado de https://www.revistasuninter.com/iusgentium/index.php/iusgentium/article/view/721

Edição

Seção

Artigos